Dica de Leitura | O Ceticismo da Fé



A verdade e a mentira foram tomar banho no rio. Despiram-se e entraram nas águas. A mentira, enganosa como sempre, saiu primeiro e vestiu-se com as roupas da verdade. A verdade preferiu andar nua a vestir as roupas da mentira. Resultado? As pessoas preferiam uma mentira transvestida a uma verdade nua e crua.

Adaptado de um antigo conto do Oriente Médio (autor desconhecido)

Quando você está lendo um livro agradável, já se sentiu parte da história ou até mesmo como se o autor estivesse aí do seu lado recitando a própria obra? Pois é, este livro de questionamentos me fez me sentir justamente assim. Li o livro no ano passado, 2020, em meio a pandemia. Pude ter uma bela prosa com o autor totalmente, reflexiva, sobre fé e bem cética. Sem nenhuma dificuldade, questionei a minha sem ao menos perdê-la em meio a tantos questionamentos levantados após a leitura. Pelo contrário, minha fé saiu mais do que fortalecida, foi ainda mais firmada na Rocha.

O Dr. Rodrigo P. Silva é curador do Museu de Arqueologia do UNASP e apresentador do programa Evidências, transmitido pela TV Novo Tempo. Também é muito conhecido no meio acadêmico e fora dele por sua exímia atuação na área da arqueologia clássica e bíblica e, também, em filosofia. Este livro, O Ceticismo da Fé, é um trabalho fantástico sobre o questionamento da fé. Sua narrativa (apesar desta frase redundante) é para aqueles não crentes que querem crer e os crentes que querem pensar. Um livro em busca da racionalidade da fé sem propriamente ser racionalismo. Um meio para intrigar ateus, agnósticos, céticos, deístas e conservadores.

O que você acha sobre falar de Deus, de Jesus, da Bíblia, de religião, ou quando sua crença é questionada? São motivos para torcermos o nariz, virarmos a cara, mudarmos de assunto, até mesmo aqueles mais ferrenhos (ou cegos) buscarem uma discussão ou uma briga sobre estes assuntos e tudo que o envolve. Contudo, o que você acha de usarmos a história deste mundo, a filosofia, talvez a arqueologia, para então questionarmos nossas crenças? Será que estamos no caminho certo? Este livro irá abrir sua mente, trará mais questões e questionamentos em sua cabeça, porém com muitas respostas honestas e bem fundamentadas.

Se olharmos para a fundamentação da fé cristã, acharemos nos seus primórdios alguns questionamentos. Jacó é conhecido por aquele que lutou com Deus, passou a ser chamado de Israel. Abraão o patriarca das três religiões monoteístas e pai da fé, questionou. Jesus, o filho de Deus, questionou antes de morrer na cruz. O famoso filósofo, físico e matemático, René Descartes, já dizia: “O homem deve desconfiar de tudo para poder acreditar em alguma coisa”. Veja, nenhum dos nomes citados acima deixou de crer em Deus, todavia tiveram sua fé fortalecida através de seus questionamentos e reflexões diárias.

Esta frase acima de René dá o insight (ideia) para o livro de Rodrigo.

A história da humanidade é repleta por crimes hediondos em nome da fé, seja esta fundamentalmente cristã, budista, islâmica ou outra. Também, a história, é repleta de crimes hediondos produzidos por ateus, evolucionistas, marxistas, nazistas, fascistas e outros. Então, sem paralelismo, poderemos crer em um Deus que mandou matar? Poderemos crer no Deus em que muitos mataram e perseguiram em Seu nome? O grande problema, talvez, com a apresentação desse tema a leitores não religiosos seja a falta de piedade na vida de pessoas que afirmam acreditar em Deus, mas vivem como se ele não existisse.

Por que igrejas tradicionais são às vezes as agremiações mais frias de que se tem notícia? É estranho vermos ladrões, traficantes, pedófilos, políticos corruptos, juízes com suas sentenças questionáveis, religiosos incoerentes vendendo a salvação ou aqueles que estão oferecendo perdão, cultuando leviandades, e tantos outros exemplos. Como podem estes homens ainda se julgarem cristãos com sua religiosidade déspota? Podemos, sem aprofundar muito, ver constantemente na mídia padres, pastores, e outros pregadores com mensagens vazias. Também achamos aqueles famosos que seguidamente realizam postagens em redes sociais de profundos pensamentos ou frases que não chegam a lugar nenhum e também não nos dizem nada servem apenas para agradarem seus milhares de seguidores acomodados. Não estaria a maioria dos seres humanos na Espiral do Silêncio apenas com o intuito de suprimirem a sua opinião ou a sua voz? Sendo assim poderiam estes se sentirem mais aceitos pela maioria ao seu redor, dessa forma não estariam silenciando a sua razão?

Durante séculos a Igreja, e aqui falo de maneira geral (conforme registros históricos), cometeu agressões grosseiras a consciência e o saber do ser humano. Entretanto, hoje se presenciarmos missas, cultos, ou shows para Deus, com mensagens de autoajuda e vazias não estaria sendo novamente uma agressão ao saber? Ainda, dentro do universo religioso, se aprofundarmos os questionamentos sobre o consumismo desenfreado e até mesmo as vendas modernas de “heresias e indulgências”, fundamentando e alimentando o mercado da fé, não seria novamente isto uma agressão ao saber? Conforme já bem interpretado por John Bunyan:

A conversão não é um processo suave e fácil como algumas pessoas imaginam; se assim fosse, o coração do homem jamais teria sido comparado a um solo não cultivado, e a Palavra de Deus, a um arado.

Quando adentramos em uma sala de aula de universidade ou até mesmo nas escolas com professores ateus e pluralistas, somos frutos de um “catequismo” por parte destes. Claro, nem todos assim o são, eu já presenciei os dois tipos. Há aqueles que defendem uma fé ateia negando a existência de um ser superior e criador (Deus). Entretanto quando contrariados podem virar “xiitas” pela defesa de seu ateísmo. Pode um criacionista (seguidor deste ramo da ciência), um cristão (que crê na criação), ter um trabalho acadêmico final formado na racionalidade, ou seja, sem que este trabalho seja fundamentado no evolucionismo ou no ateísmo. Será que a avaliação final deste trabalho acadêmico poderá ter sua aprovação negada por não defender estas teorias? Defender ideias bíblicas tornou-se moralmente questionável. Aceito o que você disse, desde que assine embaixo do que eu digo. Seria o crente em Deus um alienado, ou menos inteligente que aqueles que não creem?

Quando começo a ler um livro, leio todas aquelas partes que muitos pulam o Prefácio, Sumário, Dedicação e Introdução. Entretanto, quando vi o sumário deste livro, pulei diretamente para o capítulo 36 — Deus e o Sofrimento. Causou-me espanto quando o autor esperava por este leitor (eu), se quiser acreditar, mas o sofrimento é um dos temas mais significativos para qualquer ser humano. Uma das seções deste capítulo é intitulada: “Será que Deus existiu em Auschwitz?” apesar de haver um consenso implantado de que os sobreviventes do holocausto deixaram de acreditar em Deus, isso não é real. A maioria dos sobreviventes questionou sua fé, a fortaleceu, e continuo a crer em Deus. Cada um com sua maneira disse: “Sim, Deus estava conosco em Auschwitz”. Pode Deus estar no ser humano em seu sofrimento? “Sim, pode”!

Duas assertivas: “Não há Deus!”; “Deus Existe!”. Não deveria estas duas assertivas requerer justificações e argumentações, ao invés de serem ditas, ou cridas sem questionamentos? Discussões constantes e muito presentes continuam buscando soluções e meios que tornem cada vez mais um mundo voltado para o homem e para a sua melhor vivência em uma sociedade sem Deus. Pedimos que Ele saísse de nossas universidades, de nosso meio de trabalho, de nosso lazer e entretenimento e, até o expulsamos de nossas vidas. E, Ele saiu. Porém, quando o ser humano busca se tornar antropocentrista e tão autoconfiante, um livre-pensador, não seria este também um ingênuo? Outro questionamento para refletirmos, neste mundo barulhento e inquieto onde muitos preferem o silêncio ou a ausência, ou a inexistência de Deus. Seria o silêncio de Deus uma sabedoria e uma linguagem de amor?

No livro há uma abrangência e uma profundidade fantástica sobre diversos pontos que integram esta Fé ou este Ceticismo. Acima te trouxe mais questionamentos sobre o conteúdo do Ceticismo da Fé do que respostas, com tímidas reflexões sobre determinados pontos. Assim, como o autor, também não posso provar a existência de Deus e nem a sua inexistência, e se você ler entenderá o porquê. O livro nos presenteia com uma leitura extremamente rica, de fácil entendimento, com uma linguagem sincera, simples e direta e, é recomendável a todos. Vale apena ler, se questionar e trazer respostas a estes questionamentos. Ainda, o cristão, ou aquele que acha que é, e que vive à sua maneira, não estaria este indivíduo perdido sem Ele (O Eterno)? Deixar de acreditar na integralidade da Palavra do Senhor, ou seja, a Sola Scriptura, ou não crer na remição através da graça de Jesus e no batismo diário do Espírito Santo não seriam estes sérios enganos? Viver em um mundo sem a direção de um Deus onipotente não passaria de um louco devaneio?

Ter a mente aberta é uma virtude, mas não a ponto de o cérebro cair para fora. – James Oberg.

O ceticismo da fé: Deus: uma dúvida, uma certeza, uma distorção
Escrito por Rodrigo Silva
Editora: Ágape; 1ª Edição
592 páginas.

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