A Face Judaica do Adventismo

 

O propósito deste artigo é apresentar a teólogos adventistas e judeus o elemento judaico da fé adventista e, eventualmente, extrair, dessa associação, lições específicas no que diz respeito a identidade adventista e às relações judaico-adventistas.

Em um primeiro momento, tentarei desvendar e traçar a conexão judaica com o adventismo que é de um caráter não encontrado em nenhuma outra tradição cristã—que, em vez disso, constitui uma característica essencial da identidade judaica. Em um segundo momento, analisarei as várias respostas que têm, normalmente, surgido entre os adventistas na visão deste elemento judaico particular de sua identidade religiosa.

A Conexão Judaica

A identidade adventista possui uma diversidade extraordinária de características específicas que são uma parte importante do que caracteriza, também, a identidade Judaica. A teologia da lei dos adventistas, seu respeito pela Torah de Moisés, sua alta consideração para com as Escrituras Hebraicas, seu interesse profundo nas instituições israelitas antigas tais como o santuário levita e na significância teológica do Kippur [Dia da Expiação] judaico, seu estilo de vida e, até mesmo, seus hábitos alimentares e, ainda mais importante, a observação do mesmo sábado do sétimo dia não apenas têm-lhes posto em evidência no cristianismo, mas tem-lhes, também, tornado, teológica e, até mesmo sociologicamente, mais próximos dos judeus.

Neste artigo, minhas observações de caráter judaico no adventismo focar-se-á no sábado, não somente porque é o elemento judaico mais importante no adventismo—o mais distinto e visível—, mas, também, porque, a partir do sábado, podemos traçar as principais características da teologia adventista do sétimo dia que paralelizam com a teologia judaica.

  1. A Separação Judaico-Cristã

Por guardar o mesmo sábado do sétimo dia que os judeus—não apenas como um princípio como outras confissões cristãs, mas em realidade factual, do pôr do sol de sexta ao pôr do sol de sábado—os adventistas do sétimo dia têm feito uma declaração histórica em relação a separação judaico-cristã. O sábado desempenhara um papel importante, se não decisivo, na separação judaico-cristã. Os cristãos se separaram dos judeus por causa do sábado; eles escolheram um outro dia e rejeitaram o sábado judaico precisamente com a finalidade de diferenciarem-se dos judeus. Essa motivação já é explicitamente afirmada por Marcião no segundo século: “Porque é que o resto do Deus dos Judeus, . . . nós jejuamos nesse dia a fim de não realizar nesse dia o que fora ordenado pelo Deus dos Judeus.”1 Repetira-se e tornara-se oficial nos concílios imperiais do quarto século: “Cristãos não devem judaizar descansando no sábado, mas devem trabalhar nesse dia, honrando, em vez disso, o descanso do dia do Senhor, se possível, como cristãos. Entretanto, se alguém for encontrado judaizando, seja anátema por parte de Cristo.”2

A história da missão cristã aos judeus mostra que o movimento em massa de conversão de judeus cessou abruptamente no quarto século3 principalmente por causa da rejeição cristã à Torah e, mais especificamente, ao sábado. O historiador Jules Isaac concorda: “a rejeição judaica de Cristo foi impulsionada pela rejeição cristã da Lei.”4 Ou nas palavras do teólogo cristão Marvin Wilson: “Esta mudança à adoração dominical tornara extremamente difícil, se não virtualmente impossível, para um judeu dar qualquer consideração séria à mensagem cristã. . . . Em resumo, tornar-se um cristão era considerado como deixar para trás a judaicidade de seu passado, dificilmente uma opção válida para qualquer judeu fiel considerar.”5 Contrariamente ao que esperar-se-ia, foi na Lei, e não na controvérsia messiânica que judeus e cristãos se separaram. É significativo, de fato, que muitos Judeus haviam aceitado a Jesus como o seu Messias, enquanto não tiveram de rejeitar a Lei. É também significativo que a tradição e a história judaica atestam um grande número de interpretações e experiências messiânicas em que as fronteiras entre judeus e cristãos são confusas e, até mesmo, concorrentes—interpretações messiânicas que, às vezes, são mais enfáticas do que a sua contrapartida cristã.

Por retornar ao sábado judaico, os adventistas do sétimo dia não apenas retornaram ao mesmo sétimo dia; ele não estão, simplesmente, reagindo a tendência cristã tradicional na questão dia [santo]. Por guardar o sábado do sétimo dia, eles estão, também, afetados de forma mais profunda no conteúdo de sua teologia.

  1. Criação Versus Redenção

O sábado “judaico”, como já registrado no quarto mandamento (Êx 20:11) e na conclusão da Estória da Criação de Gênesis (Gn 2:2), carrega uma referência positiva à criação—a terra, a natureza, o corpo humano, etc.—versus o descanso “cristão” que, em referência a ressurreição de Jesus, exalta a redenção e a libertação espiritual da encarnação concreta desta Criação. Este paradigma dualista se originou na “Antítese” de Marcião e encontrou o seu espaço no cristianismo tradicional onde a redenção do corpo e o domínio espiritual é valorizado em detrimento do domínio material e físico, de modo que o ato bíblico da criação em si foi interpretado como uma mera ilustração servindo a verdade espiritual da redenção. Na tradição judaica, o sábado, por causa de sua referência à Criação, tornou-se o epítome da afirmação e da apreciação da plenitude da vida (envolvendo o corpo e os sentidos). No sábado, não só é permitido, mas é requerido apreciar a vida. Por retornar ao sábado do sétimo dia, os adventistas do sétimo dia rejeitam o paradigma marcionita e enfatizam, em vez disso, a importância da criação, dando, assim, atenção especial ao corpo, ao comer e ao beber (mensagem de saúde) e ao bem-estar físico da humanidade (Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais). É importante destacar que esta abordagem está em sintonia com o estilo de vida judaico onde o corpo concreto, o comer e o beber são uma parte inerente da religião, assim como o princípio judaico “eyn kemah eyn torah” (sem pão, sem Torah) que faz a espiritualidade dependente da existência física.

  1. A Lei

A referência à Lei está expressa no mandamento do sábado de duas perspectivas. É encontrada primeiramente da perspectiva da Criação. Por chamar atenção ao domínio concreto da existência física, a referência a Criação implica um interesse específico na ética e na justiça na vida real. Dessa perspectiva, concepções sentimentais e espirituais, como amor e crenças intelectuais, não bastam. Justiça concreta, a necessidade de justiça, torna-se um elemento importante da religião. Esta dimensão é uma característica distintiva da identidade judaica.

Concomitantemente, a adoção do sábado do sétimo dia da revelação bíblica em detrimento da tradição humana implica um reconhecimento da transcendência e do aspecto vertical da religião e encoraja, assim, um interesse renovado na dimensão da Torah na teologia adventista da aliança. Há, ainda, problemas na observância da Lei. Por exemplo, apesar das injunções bíblicas (Gn 2:4; At 15:20), os adventistas não estão certos na questão do consumo de sangue. Para se ter ideia, o ideal vegetariano promovido pelos adventistas contorna o problema, mas a questão do consumo de sangue ainda não foi resolvida. A referência para a Lei desempenha um papel específico na teologia adventista, tornando os adventistas, assim, próximos dos judeus. É, entre outros fatores, este reconhecimento da Lei que atesta o respeito por outras leis judaicas, tais como as leis alimentares e o dízimo, e, mais importantemente, o apreço profundo pelos princípios éticos e um maior interesse na dimensão religiosa da justiça e da retidão.

  1. Esperança

Uma outra dimensão importante do sábado que aproxima ainda mais os adventistas do sétimo dia dos judeus diz respeito a lição de esperança e expectativa de que é associada ao sábado do sétimo dia. Na tradição judaica, o sábado não somente tem sido interpretado como um prenúncio do “olam haba”, o reino de Deus, e, portanto, como um sinal de esperança para a perfeita harmonia e paz, mas tem, também, sido identificado como um tempo de esperança em si. Pois, como o sétimo dia, o tempo do sábado incorpora a estrutura da esperança, a esperança do “não ainda”.

Na “tradição” adventista do sétimo dia, assim como na tradição judaica, o sétimo dia está associado com o advento futuro. Por meio desta associação, os adventistas do sétimo dia estão em sintonia com os judeus; eles afirmam conjuntamente a importância do componente futuro da salvação e atestam da mesma lucidez para com o mal presente na terra.

Como um sétimo dia, o sábado é, também, o dia que marca a conclusão de toda (kol) a criação do céu e da terra (Gn 2:1–3), sendo, assim, um sinal cósmico que preestabelece o fim do mundo para a criação de um novo mundo. Uma das lições do sábado do sétimo dia é afirmar o caráter necessariamente cósmico da salvação. A teologia judaica do Kippur, o Dia da Expiação, seria, no que diz respeito, particularmente, relevante para a reflexão adventista sobre o santuário e de importante destaque nesta reflexão. Na Bíblia, bem como na tradição judaica, o edifício do santuário tem sido relacionado com a criação cósmica (Sl 78:69) e a função dessas correspondências é ressaltar a representação do santuário como um mundo.”6 Nessa perspectiva, o Dia da Expiação, que prescreve a purificação do santuário, supõe prefigurar a purificação, a recriação do mundo, chamando uma vez mais para a necessidade de uma recriação como a única solução ou resposta redentora válida para a nossa condição humana.

A mesma conexão é também sugerida na legislação rabínica do sábado que relaciona, tipologicamente, as 39 obras que não são permitidas no sábado com as 39 obras de construção do Santuário.7 Em cada sábado, o judeu ortodoxo é, portanto, impelido a relembrar a relação entre o santuário e o sábado, uma lição teológica nem um pouco insignificante na teologia adventista.8

Como podemos ver, a identidade adventista oferece um grande número de paralelos interessantes com a identidade judaica. Mostrei apenas alguns dos mais importantes. Embora nem todos os Adventistas estejam familiarizados com a significância profunda dessas conexões, mesmo em um nível superficial, as conexões são suficientemente claras para tornar qualquer adventista das relações religiosas e teológicas especiais com os judeus.

A Resposta Adventista

Para essa conexão particular com o judaísmo, os adventistas têm respondido de várias formas que vão desde as mais positivas até as mais negativas e, muitas vezes, de um modo ambivalente.

  1. A Resposta Positiva

É bastante compreensível que a adoção do sábado e de outras características distintivas do judaísmo têm encorajado entre muitos adventistas uma simpatia maior para com os Judeus. Diversas vezes tenho ouvido adventistas do sétimo dia expressando sentimentos positivos observando os judeus indo à sinagoga no sábado pela manhã enquanto eles mesmos estão indo à igreja. Por causa da guarda do sábado, os adventistas do sétimo dia têm, muitas vezes, sido, e ainda são, identificados como judeus e têm, por vezes, sido alvo de desconfiança e contratempos (como é o caso de adventistas do sétimo dia em alguns países africanos e árabes). Escolhas alimentares similares têm associado, até mesmo, judeus e adventistas no mercado local, pois adventistas são, frequentemente, vistos próximos dos judeus na seção [de alimentos] kosher. A curiosidade adventista quanto as experiências religiosas e interpretações judaicas está bem atestada não apenas entre membros leigos, mas, também, entre teólogos adventistas (ver, por exemplo, a importância de Abraham Heschel na reflexão adventista sobre o sábado). Esses sofrimentos comuns e as similaridades de experiências e de crenças têm, naturalmente, inculcado sentimentos muitos positivos por parte dos adventistas para com os judeus.

  1. Supersessionismo

“Supersessionismo” (do latim “supersede”, que significa “sentar-se no lugar de”) é uma antiga ideologia cristã9 que fora, primeiramente, defendida, em termos eclesiásticos, no quarto século, pela Igreja Católica (a igreja, como a cidade de Deus, o novo Israel, substituiu a sinagoga, o antigo Israel) e, [, posteriormente,] em termos teológicos, pelo protestantismo continental (o Israel espiritual com a graça do Evangelho substituiu o Israel carnal com a Lei de Moisés).

Este último supersessionismo pode parecer mais elegante e mais sofisticado do que o anterior, mas carrega o mesmo dano potencial: “Se eu sou o verdadeiro Israel e você não é, você não merece viver como Israel.” Este é o porquê o supersessionismo tem sido diagnosticado como um “holocausto espiritual” abrindo caminho para o holocausto físico. Franklin Littel observa: “A pedra angular do antissemitismo cristão, o mito da supersessão e da substituição . . ., ressoa com um tom genocida.”10

Ideias supersessionistas foram e ainda são ensinadas pelos adventistas que lhas herdaram, entre outros grãos de poeiras, da igreja tradicional (católica e protestante). Contudo, considerando a aparição tardia do adventismo no cenário das religiões, e sua conexão especial com os judeus, o supersessionismo é inconsistente com a teologia adventista.

Na verdade, os adventistas não podem afirmar como pode a Igreja Católica que eles têm substituído o Israel histórico do Antigo Testamento (supersessionismo eclesiástico) porque eles apareceram muito tempo após a separação. Nem podem eles arguir que o sábado judaico, ou a Torah, foi substituído por um outro sábado cristão, ou pela graça (supersessionismo teológico), pois eles têm incorporado, conjuntamente, intensamente, a teologia do sábado e da Lei com a teologia da graça.

Além do mais, nas linhas do supersessionismo eclesiástico, o supersessionismo adventista enfatizou a ideia de um remanescente espiritual, como o Israel espiritual—o Israel de Deus—que substituiu o Israel físico. Esses adventistas, muitas vezes, identificam-se como o remanescente escolhido e a reivindicação é ouvida, certas vezes, com algumas características ufanistas.

Também, mas linhas do supersessionismo teológico, alguns adventistas mantêm que eles entendem e vivem o sábado e a Torah de uma maneira superior e mais espiritual do que os judeus que são legalistas. Em contraste com o sábado “judaico”, o sábado “adventista” é chamado de sábado “tocado pelo Evangelho,”11 ou, em comparação com o sábado judaico de Joe Lieberman, o sábado do “adventista Joe.”12 Observe o testemunho comovente de May-Ellen Colon que, com gratidão, reconhece seu débito existencial e teológico com o sábado judaico e a recomendação feita por John Graz: “Temos, ainda, muitas lições para aprender com eles.”13

É significativo, no entanto, que essas apresentações do chamado sábado “adventista” não estão em contradição com uma compreensão judaica do sábado. É, também, irônico que para fundamentar o caráter adventista específico do sábado, muitos desses autores adventistas têm, diversas vezes, recorrido e, extensivamente, se referido a autoridades judaicas tais como Abraham Heschel.14 Esta insistência em traçar a diferença entre o sábado judaico e o sábado adventista é, portanto, um pouco suspeita. À luz da história, é uma reminiscência do antigo temor antissemita cristão, bem como a motivação que precipitou a primeira “apostasia” da Igreja.

  1. A Rejeição

A ideia cristã da rejeição dos judeus, apesar de não fundamentada pelas Escrituras (ver Rm 11:1), é um corolário da ideia de supersessionismo. Ambas as ideias caminham juntas. Supersessionismo implica rejeição. Mas, mesmo assim, é possível manter a ideia de rejeição sem ter que recorrer à ideia de supersessionismo. Bastar dizer que Israel foi rejeitado e, portanto, perdeu seu status como um povo escolhido, ou como uma testemunha. Sobre essa premissa, a herança judaica do cristianismo, e aqui do adventismo, será negada e alternativas mais palatáveis podem ser propostas.

Uma ilustração perfeita dessa reação pode ser encontrada precisamente em relação ao sábado. Adventistas que se recusam a assumir a conexão judaica do sábado têm sugerido, em vez disso, inúmeras opções: o sábado viera até eles não pelos judeus, mas de um “remanescente espiritual” que sobreviveu ao longo do tempo; Adventistas que se consideram os herdeiros deste remanescente não devem o sábado aos judeus rejeitados, mas, por sua vez, a esses cristãos fiéis. Infelizmente, este remanescente é, essencialmente, um conceito abstrato e não leva a sério o testemunho da história; esta tese ignora, também, o fato histórico que esses cristãos que adotaram o sábado do sétimo dia, muitas vezes, o fizeram sob uma significativa influência judaica. Contudo, somente os judeus, como um grupo histórico e visível, têm, outrora, testemunhado do sábado. Outros preferem encontrar o sábado em sua própria cultura (“a conexão africana”). Aqui, também, a conexão não é estabelecida, e, mesmo se fosse, os casos são raros e não refletem um testemunho histórico do sábado. Na verdade, a única evidência africana séria do sábado bíblico é encontrada na tradição etiopiana que se originou em solo judeu.

Outros, finalmente, responderão que o sábado não é nem judeu, africanos, nem adventista: vem de Deus. Este argumento parece altamente espiritual e indiscutível (quem quereria competir com Deus?). No entanto, este argumento aparentemente humilde e espiritual esconde o orgulho e, de forma sutil, pode disfarçar a repulsa antissemita à ideia de que eles podem ter algo a ver com os judeus. Alguns têm ido tão longe nessa linha de raciocínio que eles têm afirmado que o sábado judaico, que começa na noite de sexta-feira, não fora, na verdade, o verdadeiro sábado revelada por Deus, mas era, em lugar disso, uma distorção judaica do sábado divino que supostamente começa na manhã de sábado (note que a discussão teológica pré-nazista sobre a natureza de Jesus, que não poderia ser um judeu desde que ele era Deus ou de uma origem ariana, é da mesma linha). Esclarecendo: o sábado vem de Deus. Ele fora iniciado e criado por Deus. Mas como podemos saber disso? Somente por meio do testemunho humano.

A sugestão de que não precisamos dos outros humanos para ter acesso à revelação divina reflete um tipo de pensamento filosófico/grego. Ignora o hebraico bíblico princípio da encarnação que requer o testemunho humano em busca da verdade divina. “Deus precisa do homem.” Ignora não só a evidência da história da salvação, mas, também, a inequívoca declaração de Paulo de que os israelitas pertencem “a adoção e também a glória, as alianças, a legislação [incluindo o sábado], o culto e as promessas” (Rm 9:4).

Conclusão: Desafios e Esperanças.

Por anos, tenho sido capaz de observar e suportar reações perturbadoras por parte de alguns adventistas à presença judaica dentre eles. Para citar algumas: a relutância em envolver os judeus no ministério de evangelismo aos judeus ou na discussão teológica sobre Israel; a dificuldade em reconhecer e confrontar incidentes antissemitas (frequentemente desprezado como “sensibilidade” ou “vitimização”); a omissão a qualquer referência ao antissemitismo na discussão sobre o racismo ou a ausência virtual de reflexão teológica sobre o Holocausto.

Paradoxalmente, no entanto, nos últimos anos as coisas mudaram dramaticamente quanto a essas questões. Mais e mais judeus adventistas afirmam sua identidade judaica e são calorosamente recebidos como tais. Temos agora, pela primeira vez, um Instituto de Estudos Judaico-Cristão no Seminário Teológico Adventista do Sétimo Dia (Andrews University). Realizamos, também, pela primeira vez, um Simpósio sobre O Holocausto com uma seção especial sobre teologia adventista após Auschwitz. Também, pela primeira vez, temos um judeu como presidente do Campo de Israel e na chefia do “World Jewish Friendship Committee [Comitê Mundial da Amizade Judaica].” Mas, acima de tudo, pela primeira vez na história adventista, serviços de adoração judaico-adventistas têm surgido em todo o mundo, não somente permitindo aos judeus adventistas adorar de acordo com a sua cultura e sensibilidade, mas, também, enriquecendo a experiência de adoração e a espiritualidade da comunidade adventista e, até mesmo, as comunidades judaicas e cristãs em geral. Nada disso poder-se-ia imaginar há alguns anos. De fato, conexão judaico-adventista está ficando cada vez mais forte.

Às vezes, pergunto a mim mesmo se este movimento não está, de fato, cumprindo as palavras do último profeta hebreu, Malaquias, que vira outro advento de Elias que “converterá o coração dos pais aos filhos e o coração dos filhos a seus pais, para que eu não venha e fira a terra com maldição” (Ml 4:6). O reavivamento do elemento judaico da fé adventista pode, muito bem, enriquecer e aprofundar esta fé, aproximando adventistas dos judeus. Pode, também, nesses tempos em que muitos cristãos estão interessados em renovar suas raízes judaicas, aproximar adventistas à comunidade cristã em geral, bem como ao mundo.

No início da era cristã, a Igreja, a fim de ganhar o mundo, cortou suas raízes judaicas. Pode ser que, no final de seu curso, a Igreja ganhará o mundo retornando (teshuva) à face judaica de sua identidade?


Notas

[1] Tertuliano, Contra Marcião, 4.12.7.

[2] Cânone 29 do Concílio de Laodiceia.

[3] Ver, sobre esse assunto, a obra do sociologista Rodney Stark, The Rise of Christianity: A Sociologist Reconsiders History (Princeton, NJ: Princeton University Press, 1996).

[4] Jules Isaac, Genèse de l’Antisémitisme: essai historique (Paris: Calmann-Lévy, 1956), p. 147.

[5] Marvin R. Wilson, Our Father Abraham: Jewish Roots of the Christian Faith (Grand Rapids, MI: W. B. Eerdmans, 1989), p. 80.

[6] Jon D. Levenson, Creation and the Persistence of Evil: The Jewish Drama of Divine Omnipotence (Princeton, NJ: Princeton University Press, 1994), p. 86.

[7] Shabbat VII.2.

[8] Ver Uriah Smith, “The Sanctuary and the Sabbath are Inseparably Connected” (The Advent Review, 25 de julho de 1854, p. 196); cp. Raymond F. Cottrell, “The Sabbath in the New World,” em The Sabbath in Scripture and History, e. Kenneth A. Strand (Washington, DC: Review and Herald Publishing Assoc., 1982), pp. 257–259.

[9] Para um resumo da história desta doutrina, ver John Pawlikowski, Jesus and the Theology of Israel (Wilmington, DE: Michael Glazier, 1989), pp. 10–11.

[10] Franklin H. Littell, The Crucifixion of the Jews (Macon, GA: Mercer University Press, 1986), p. 2. Ver, também, a página 1 onde Littel fala sobre “o fio vermelho que liga um Justino Mártir, ou um Crisóstomo, a Auschwitz e Treblinka” e a página 30 onde ele descreve a “solução final” como uma “extensão lógica” da teologia cristã do supersessionismo.”

[11] Fritz Guy, Thinking Theologically: Adventist Christianity and the Interpretation of Faith (Berrien Springs, MI: Andrews University Press, 1999), p. 237.

[12] E. Edward Zinke, “Is There One Sabbath for Joe Lieberman and Another for Joe Adventist?” Perspective Digest 5, no. 4 (2000): 19 ff.

[13] John Graz, “Still Lessons to Learn,” Perspective Digest 5, no. 4 (2000): 17.

[14] Guy, p. 239; Zinke, p. 20.


Jacques Doukhan é Professor de Hebraico, Professor de Exegese do Antigo Testamento e Diretor do Instituto de Estudos Judaicos-Cristãos na Andrews University. Autor de diversos livros como “The Mystery of Israel,” “On the Way to Emmaus”, “Israel and the Church;” escreveu, também, a Lição da Escola Sabatina de Provérbios do 1º Trimestre de 2015.


Tradução: Hugo Martins

O artigo “A Face Judaica do Adventismo” (Original em inglês: The Jewish Face of Adventism), de Jacques Doukhan, fora publicado, inicialmente, em 18 de novembro de 2015 na revista Shabbat Shalom.® Usado com permissão do autor.

Fonte: https://www.estudosadventistas.com.br/a-face-judaica-do-adventismo/

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